Primeiramente, gostaria de agradecer a participação de vocês durante as últimas aulas. Sem ela, aproveitaríamos muito menos esse tempo precioso para a expressão, reflexão e aprimoramento de nossas ideias. Vamos lá:
Depois de nos perguntarmos o que é e para que serve a filosofia, descobrimos que seria uma atitude mais produtiva começarmos pela ação. Assim como nas primeiras aulas de matemática não perguntamos o que é matemática, mas aprendemos a contar e calcular, também na filosofia não temos a obrigação de saber com absoluta clareza o que ela é para exercitarmos o pensamento crítico e a reflexão sobre conteúdos específicos da área.
Uma forma simples de descobrir o que é a filosofia e aprender a filosofar é estudando o texto de um filósofo e observando o que ele faz através deste texto. Foi o que fizemos nas turmas 2003 e 2004, em que tivemos o prazer de ler algumas linhas de "O que é o iluminismo?", do filósofo alemão Immanuel Kant.
Muitos conceitos e princípios naturalizados e que, hoje em dia, temos como "óbvios" ou "evidentes", como os direitos humanos ou a liberdade individual, formaram-se há pouco mais de um par de séculos. Como observa Lynn Hunt, professora de história da Universidade da Califórnia e autora de A invenção dos direitos humanos, "no século XVIII (e de fato até o presente) não se imaginavam todas as 'pessoas' como igualmente capazes de autonomia moral. Duas qualidades relacionadas mas distintas estavam implicadas: a capacidade de raciocinar e a independência de decidir por si mesmo" (p. 26).
No texto de Kant, essa ideia fica clara: embora sejamos capazes de sair da menoridade que nos impomos, poucos seriam aqueles que, na sua época, teriam coragem para "fazer uso de seu próprio entendimento sem a condução de outro". Este problema era e é um problema de ordem política, pois uma vez que admitimos a possibilidade de pensarmos por conta própria, temos que nos perguntar por que não é em todos os casos que essa possibilidade se torna realidade.
Quem saiu da menoridade, ou seja, quem é autônomo e quem não é?
Quem define quem é autônomo e quem não é?
Quem ou o que é responsável pela permanência ou saída daquele estado de menoridade, apenas o indivíduo ou também a sociedade na qual ele nasceu?
Qual o papel das instituições sociais e, no nosso caso, da escola, neste processo de condução para a servidão ou para a autonomia?
Estou me tornando um cidadão livre e responsável ou um ser robotizado, que só sabe dizer "não, senhor" e "sim, senhor", como aquele descrito por Pitty em Admirável Chip Novo?
Por essa música, eu diria que a Pitty é amiga da Sofia.
Para terminar o post, deixo duas dicas de fontes que influenciaram esta música. Uma é previsível: o livro Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, que inspirou não só o título da música, mas boa parte da ficção científica do século XX (e que, em alguns aspectos, não é mais ficção). A outra é o filme Blade Runner: o caçador de andróides, de Ridley Scott. Eis um vídeo:
Até a próxima aula!
2 comentários:
As músicas da Pitty relatam muito bem esse "senso comum" das pessoas, que seguem aquilo que é imposto na sociedade. Justamente por suas letras que eu admiro o seu trabalho, as suas letras sempre falam do cotidiano de uma pessoa em relação à sociedade, buscam desenvolver pensamentos críticos, nos faz pensar no modo de vida em que vivemos, como o comodismo das pessoas, que é relatado na música "Semana que Vem", que diz "Não deixe nada para depois, não deixe o tempo passar. Não deixe nada para semana que vem, porque semana que vem pode nem chegar", e também relatar o passado, que tem muito a ver com o desenvolvimento da propriedade privada e materialismo, que é sempre citado também em suas músicas, como em "Só de Passagem", onde o trecho da música diz "Eu possuo muitas coisas e nada disso me possui".
Oi, Rodrigo. Gosto muito de "Pais e Filhos", do Legião Urbana, que tem muito a ver com "Semana que Vem": "É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã porque se você parar pra pensar, na verdade, não há". Essa frase me faz pensar em como o futuro é formado por construções presentes: muitas delas são realmente necessárias, outras servem apenas como justificativa para a acomodação do pensamento. Por exemplo: a ideia comum de que "o mundo não vai mudar", que se torna uma profecia autorrealizada. O mundo não muda simplesmente porque as pessoas pensam que ele não vai mudar (ações partem de pensamentos, ideias). Mas, como disse o Kant, "Como é cômodo ser menor!", como é cômodo inventar um preceito desses para me privar de ações baseadas na ideia de um mundo que pode mudar (e que pode ser mais justo)! Se eu penso que o mundo não vai mudar, posso agir de acordo com este mundo, posso concordar com ele e não questionar os absurdos do meu cotidiano, posso ficar na "zona de conforto". Mas isso não passa de autoengano.
Um abração!
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